Investigar a máfia dos transportes e construir moradias populares seguras
- PSOL Niterói
- 29 de abr. de 2019
- 4 min de leitura

Nossa cidade nunca teve um orçamento tão alto como o deste ano, de R$ 3,2 bilhões. Em Niterói, ainda convivem, no entanto, uma finita riqueza robustecida pelos royalties do petróleo — R$ 1,3 bilhão, que correspondem a mais de um terço do orçamento total — e uma insistente miséria que assombra pelo menos um quarto da população, assim submetida a uma permanente condição de risco em assentamentos precários ou em situação de rua.
Na raiz dos problemas estruturais de Niterói — cidade com graves debilidades em infraestrutura urbana, mobilidade, acessibilidade, transporte, educação, saúde, moradia, lazer, segurança e meio ambiente — há um modelo político-econômico que curva o poder público aos interesses do empresariado e de seus grandes e lucrativos negócios. Niterói é um lugar onde viver bem é privilégio de quem pode pagar caro por serviços básicos.
Os setores de transportes, imobiliário e lojista pautam em grande parte a atuação do Executivo Municipal e da Câmara Municipal, por meio de velhas práticas como o clientelismo, o fisiologismo e a cooptação de movimentos para a neutralização das lutas.
Numa Niterói predominantemente privatizada, a esta altura do ano ainda há crianças fora da escola por falta de vagas no Ensino Fundamental e a educação inclusiva está sucateada. Quem depende do transporte público paga caro por serviços sofríveis. A saúde mental está precarizada, os doentes carecem de exames, de UTIs e de leitos e as pessoas em situação de rua, de alimento, abrigo e respeito à liberdade constitucional de ir e vir.
Estima-se em 40 mil o número de famílias que residem em assentamentos populares precários. Quem mora nas favelas enfrenta deslizamentos e desmoronamentos, sem falar na falta de saneamento e limpeza e na sangrenta política de segurança pública que vitima a juventude negra e favelada. Além de tudo, na nossa cidade, segundo o Instituto de Segurança Pública (ISP), dobraram nos dois primeiros meses de 2019, os índices de letalidade violenta em relação ao ano passado, com destaque para o aumento dos autos de resistência. Em cada duas pessoas assassinadas no período, uma — em geral um jovem negro e pobre — foi morta pela polícia.
Precisamos denunciar, nesse sentido, a ameaça que representa para a nossa cidade um certo projeto político impulsionado pela extrema direita e seu discurso de ódio inspirado no ideário fascista. Esse projeto se apresenta como oposição ao governo, mas não se opõe, de fato, ao modelo histórico de cidade boa somente para os ricos. Pelo contrário, se propõe a acirrar ainda mais a barbárie, a desigualdade, a violência do Estado, a segregação social, a perseguição aos pobres, a LGBTfobia, a violência doméstica, o feminicídio, o genocídio negro, o racismo ambiental e o institucional.
Precisamos superar esse projeto político que prioriza o interesse privado e elitista em detrimento das demandas essenciais do conjunto da população, um projeto que tem se perpetuado no poder e, em especial, a partir das gestões “de esquerda” do ex-prefeito Jorge Roberto Silveira até o atual mandato de Rodrigo Neves. Defendemos, inclusive, a necessidade de rigorosa apuração na Câmara das graves acusações que pesam contra o prefeito atual, de recebimento de propina de empresários de ônibus para a liberação de repasses referentes às passagens gratuitas para pessoas com deficiência, grávidas, idosos e gestantes. Repudiamos, no entanto, as condições arbitrárias e não condizentes com um Estado democrático de direito em que ocorreu e perdurou por três meses a prisão preventiva de Rodrigo Neves, no bojo da seletiva Operação Lava Jato. Nesse sentido, consideramos correta a decisão judicial que determinou a sua soltura.
Nos últimos três meses, o prefeito (sem vice) foi substituído pelo presidente da Câmara, Paulo Bagueira. Este, alçado nesta semana ao cargo de secretário executivo, cumpriu sem traumas o papel de gerente da Câmara, para mantê-la a serviço dos interesses de sempre. Foi nesse período, inclusive, que os vereadores, com exceção da bancada do PSOL, aprovaram a criação de um fundo de depósito de 10% dos royalties, com o fim de usar tais recursos para futuras correções de eventuais desequilíbrios na receita municipal. Em primeiro lugar é necessário garantir transparência, debate público e controle social sobre os destinos da totalidade dos recursos dos royalties. Esses recursos deveriam ser destinados ao desenvolvimento de matrizes energéticas limpas, à recuperação, restauração e preservação do meio ambiente; assim como ao enfrentamento do grave problema habitacional existente em nosso município. Desse modo, em vez de obras “tapa-buracos”, seria possível uma intervenção estrutural nas favelas e assentamentos da cidade que pudesse evitar as sucessivas tragédias socioambientais que afetam principalmente as famílias mais pobres.
Se nossa cidade é afetada por tantas mazelas e ameaças, também é importante reconhecer, contudo, que existe luta e que é na luta que construímos resistência e mudanças. Os movimentos de defesa de direitos, autônomos em relação a governos e empresários, ganham gradativamente mais força. É nesse contexto que se afirma a luta por um modelo de cidade onde os recursos sirvam para garantir a vida e os direitos dos cidadãos. Os sem teto, quilombolas, marisqueiros, pescadores artesanais, caiçaras, ambulantes, motoboys, quiosqueiros e desempregados persistem na resistência e na luta coletiva contra políticas que segregam e oprimem os mais pobres. Uma conquista recente desses movimentos populares da cidade foi a aprovação da lei de autoria do deputado estadual Flavio Serafini que garantiu a tarifa social das barcas Charitas/Rio, numa demonstração da importância de mandatos legislativos comprometidos com as causas populares.
Esta nota do PSOL Niterói tem por propósito, principalmente, alertar para que a vida em Niterói não prossiga normalmente após o retorno de Rodrigo Neves à Prefeitura, como se nada houvesse acontecido. Precisamos identificar os responsáveis pelos esquemas que estão por detrás dos inaceitáveis preços das passagens em Niterói. Temos que identificar e responsabilizar aqueles que enriquecem em nossa cidade às custas da exploração do serviço público. Temos que lutar por transporte público de qualidade a preço acessível à população. Até que isso aconteça, não nos calaremos. Será o povo organizado nas lutas coletivas, afinal, que vai reescrever a história da nossa cidade.
PSOL Niterói Niterói, 12 de abril de 2019